sexta-feira, 29 de julho de 2011

Mudança - por Clarice Lispector


Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa. Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua. Depois, mude de caminho, ande por outras ruas, calmamente, observando com atenção os lugares por onde você passa.
Tome outros ônibus.
Mude por uns tempos o estilo das roupas. Dê os seus sapatos velhos. Procure andar descalço alguns dias. Tire uma tarde inteira para passear livremente na praia, ou no parque, e ouvir o canto dos passarinhos. Veja o mundo de outras perspectivas.
Abra e feche as gavetas e portas com a mão esquerda. Durma no outro lado da cama... Depois, procure dormir em outras camas. Assista a outros programas de tv, compre outros jornais... leia outros livros. Viva outros romances.
Não faça do hábito um estilo de vida. Ame a novidade. Durma mais tarde. Durma mais cedo. Aprenda uma palavra nova por dia numa outra língua. Corrija a postura. Coma um pouco menos, escolha comidas diferentes, novos temperos, novas cores, novas delícias.
Tente o novo todo dia. O novo lado, o novo método, o novo sabor, o novo jeito, o novo prazer, o novo amor. A nova vida. Tente. Busque novos amigos. Tente novos amores. Faça novas relações. Almoce em outros locais, vá a outros restaurantes, tome outro tipo de bebida, compre pão em outra padaria. Almoce mais cedo, jante mais tarde ou vice-versa. Escolha outro mercado... outra marca de sabonete, outro creme dental...
Tome banho em novos horários. Use canetas de outras cores. Vá passear em outros lugares. Ame muito, cada vez mais, de modos diferentes.
Troque de bolsa, de carteira, de malas, troque de carro, compre novos óculos, escreva outras poesias. Jogue os velhos relógios, quebre delicadamente esses horrorosos despertadores.
Abra conta em outro banco. Vá a outros cinemas, outros cabeleireiros, outros teatros, visite novos museus. Mude.
Lembre-se de que a Vida é uma só. E pense seriamente em arrumar um outro emprego, uma nova ocupação, um trabalho mais light, mais prazeroso, mais digno, mais humano. 
Se você não encontrar razões para ser livre, invente-as. Seja criativo. E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa, longa, se possível sem destino. Experimente coisas novas. Troque novamente. Mude, de novo. Experimente outra vez. Você certamente conhecerá coisas melhores e coisas piores do que as já conhecidas, mas não é isso o que importa.
O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia. Só o que está morto não muda ! Repito por pura alegria de viver: a salvação é pelo risco, sem o qual a vida não
vale a pena!

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Sobre a Roda...





 "A Roda participa da perfeição sugerida pelo círculo, mas com uma certa valência de imperfeição, porque ela se refere ao mundo do vir a ser, da criação contínua e da contingência. Simboliza os ciclos, os reinícios e as renovações ...” (Gabrielle Wosien

Quando criei este blog, fiquei me perguntando qual seria o título dele e algumas ideias surgiram, como: coisas da vida (pensei: muito clichê) e cirandas. Mas, algo insistia em rodar nos meus pensamentos e quando percebi estava resistindo a algo que já estava ali, praticamente imposta a mim mesma e eu insistia em vendar meus olhos.  Era um momento (e descobri que sempre é) de: renovar, redescobrir um lugar, reinventar, estar junto, brincar de viver, aprender e reaprender, de perceber que a história não tem fim, ela pode sempre recomeçar...

A proposta da roda é um novo jeito de caminhar, que não é mais solitário; abrir uma roda que conversa, que discute, que participa, que compartilha, uma roda que faz a vida rodar! Roda é encontro, é vínculo, é diversão... é girar junto, ao lado de. Assim são as relações, uma roda disparando outra roda... uma roda gigante... num sobe e desce constante, uma Roda Viva. A roda é a potência do encontro, da coletividade...

Nesta caminhada, nesta roda quente e cheia de vida, somos passageiros que rodamos sem parar. Somos laços, somos fitas que se atrapalham, se alastram, que vão para rumos diferentes, mas ao mesmo tempo nos encontramos, estamos entrelaçados. Quantos nós se encontram, se separam, se unem e se dispersam ao longo da vida. Como num baile que tem ritmo próprio. Vocês já se deram conta de quantos movimentos fazemos na vida? Pois é, isto é a RODA: não tem fim, está sempre terminando ao mesmo tempo em que num novo início.

Na Roda Viva há ventos de esperança, mãos que acolhem e que juntos com os pés, aqueles que nos sustentam, fazem a roda continuar a girar. As diversidades da vida, do humano, a dissonância e a consonância dão movimento à roda! Assim, a ciranda está aberta, ela vai se formando, em verso e prosa, com laços de amizade e quem sabe algumas dificuldades e/ou facilidades... Então os convido: entrem na roda cirandeiros, venham cirandar, coloca tua mão na minha e vem comigo rodar, experimentar...

E para encerrar apresento um trecho da música que deu origem ao título do meu blog:

Roda Viva – Chico Buarque
"Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu
A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega o destino pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Roda-moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração"