sábado, 6 de agosto de 2011

A crença nos remédios

Recebi e compartilho com vocês... Muito pertinente. Isso me fez lembrar do meu primeiro texto aqui no blog.

Se você ou algum familiar tiver diabetes, terá dificuldades em conseguir a medicação no SUS (mesmo que tenha médico particular, faltarão amostras grátis) e vai pagar caro nas farmácias. Por outro lado, todos nós somos induzidos ao consumo por ofertas em comerciais de medicamentos de que não precisamos – a começar pelas “vitaminas” – e a classe médica é cada vez mais assediada pelos laboratórios para prescrever medicamentos desnecessários.
É fácil constatar que a oferta não está relacionada às necessidades dos pacientes, mas sim ao interesse dos fabricantes. Por isso, o Conselho Federal de Medicina estabeleceu normas para enfrentar o problema, como por exemplo que os palestrantes em Congressos Médicos, caso tenham suas despesas custeadas por laboratórios, tenham de explicitar isso nas suas apresentações. Quer dizer, a ética profissional impõe preservar a categoria do “lobby” voluntário ou involuntário dos colegas que se deixam seduzir pelo marketing das grandes empresas do ramo.
Essa situação só existe porque as pessoas gostam de usar drogas, sejam as consideradas lícitas (os medicamentos), ou ilícitas. É uma espécie de crença, de que são as substâncias que vão resolver nossos problemas, desde nos livrar de uma simples dor até nos deixar mais próximos da felicidade.
Tal como previsto no “Admirável Mundo Novo”, a obra genial de Aldous Huxley, hoje verdadeiras multidões dependem do consumo diário de antidepressivos e estabilizadores do humor, ansiolíticos e hipnóticos (os que induzem sono), entre outros, para sua estabilidade emocional. Trata-se de um “pensamento mágico”, uma fantasia que faz parte da nossa condição humana, de nos apegarmos a alternativas que nos proporcionam uma “fuga” instantânea de problemas que cremos poder evitar de enfrentar, mas que na verdade só são adiados ou mudam de forma. O avanço tecnológico permite maior qualidade de vida, sim, os conhecimentos bioquímicos evoluíram e tudo seria ótimo se estivesse sob controle da ciência médica, a serviço do bem estar das pessoas, mas não está.
O fato é que não estamos falando apenas de Medicina ou Psicologia e sim de Economia, mercado e indução ao consumo, pois a indústria farmacêutica está entre as que mobiliza as maiores cifras em negócios no mundo todo, a um nível comparável à indústria de armas, por exemplo. Na linguagem popular, se diz que é “briga de cachorro grande”, como a polêmica entre a FDA (Food and Drug Administration) e a Anvisa, pelo fato de o órgão americano (responsável pela regulamentação e fiscalização em seu país) haver instalando filial no Brasil, como tem feito no mundo todo.
A FDA alega que visa o controle da produção de substâncias que seriam exportadas aos Estados Unidos, como ocorreu no caso da China, que só aceitou a filial da FDA após muita polêmica e depois do caso dos brinquedos contaminados por chumbo, exportados pelos chineses. A Anvisa desconfia que a intenção alegada não seria o motivo final para a internacionalização da FDA, que estaria a serviço de um suposto “lobby” das empresas americanas. Tradicionalmente a FDA era considerada tão rigorosa que a indústria farmacêutica americana era acusada de fabricar em outros países o que lhe era vedado na América. Ao invés de proteger a cidadania, teria se tornado coadjuvante dos negócios ? Uma polêmica atual e de interesse de todos.

Montserrat Martins, colunista do EcoDebate, é Psiquiatra




sexta-feira, 29 de julho de 2011

Mudança - por Clarice Lispector


Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa. Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua. Depois, mude de caminho, ande por outras ruas, calmamente, observando com atenção os lugares por onde você passa.
Tome outros ônibus.
Mude por uns tempos o estilo das roupas. Dê os seus sapatos velhos. Procure andar descalço alguns dias. Tire uma tarde inteira para passear livremente na praia, ou no parque, e ouvir o canto dos passarinhos. Veja o mundo de outras perspectivas.
Abra e feche as gavetas e portas com a mão esquerda. Durma no outro lado da cama... Depois, procure dormir em outras camas. Assista a outros programas de tv, compre outros jornais... leia outros livros. Viva outros romances.
Não faça do hábito um estilo de vida. Ame a novidade. Durma mais tarde. Durma mais cedo. Aprenda uma palavra nova por dia numa outra língua. Corrija a postura. Coma um pouco menos, escolha comidas diferentes, novos temperos, novas cores, novas delícias.
Tente o novo todo dia. O novo lado, o novo método, o novo sabor, o novo jeito, o novo prazer, o novo amor. A nova vida. Tente. Busque novos amigos. Tente novos amores. Faça novas relações. Almoce em outros locais, vá a outros restaurantes, tome outro tipo de bebida, compre pão em outra padaria. Almoce mais cedo, jante mais tarde ou vice-versa. Escolha outro mercado... outra marca de sabonete, outro creme dental...
Tome banho em novos horários. Use canetas de outras cores. Vá passear em outros lugares. Ame muito, cada vez mais, de modos diferentes.
Troque de bolsa, de carteira, de malas, troque de carro, compre novos óculos, escreva outras poesias. Jogue os velhos relógios, quebre delicadamente esses horrorosos despertadores.
Abra conta em outro banco. Vá a outros cinemas, outros cabeleireiros, outros teatros, visite novos museus. Mude.
Lembre-se de que a Vida é uma só. E pense seriamente em arrumar um outro emprego, uma nova ocupação, um trabalho mais light, mais prazeroso, mais digno, mais humano. 
Se você não encontrar razões para ser livre, invente-as. Seja criativo. E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa, longa, se possível sem destino. Experimente coisas novas. Troque novamente. Mude, de novo. Experimente outra vez. Você certamente conhecerá coisas melhores e coisas piores do que as já conhecidas, mas não é isso o que importa.
O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia. Só o que está morto não muda ! Repito por pura alegria de viver: a salvação é pelo risco, sem o qual a vida não
vale a pena!

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Sobre a Roda...





 "A Roda participa da perfeição sugerida pelo círculo, mas com uma certa valência de imperfeição, porque ela se refere ao mundo do vir a ser, da criação contínua e da contingência. Simboliza os ciclos, os reinícios e as renovações ...” (Gabrielle Wosien

Quando criei este blog, fiquei me perguntando qual seria o título dele e algumas ideias surgiram, como: coisas da vida (pensei: muito clichê) e cirandas. Mas, algo insistia em rodar nos meus pensamentos e quando percebi estava resistindo a algo que já estava ali, praticamente imposta a mim mesma e eu insistia em vendar meus olhos.  Era um momento (e descobri que sempre é) de: renovar, redescobrir um lugar, reinventar, estar junto, brincar de viver, aprender e reaprender, de perceber que a história não tem fim, ela pode sempre recomeçar...

A proposta da roda é um novo jeito de caminhar, que não é mais solitário; abrir uma roda que conversa, que discute, que participa, que compartilha, uma roda que faz a vida rodar! Roda é encontro, é vínculo, é diversão... é girar junto, ao lado de. Assim são as relações, uma roda disparando outra roda... uma roda gigante... num sobe e desce constante, uma Roda Viva. A roda é a potência do encontro, da coletividade...

Nesta caminhada, nesta roda quente e cheia de vida, somos passageiros que rodamos sem parar. Somos laços, somos fitas que se atrapalham, se alastram, que vão para rumos diferentes, mas ao mesmo tempo nos encontramos, estamos entrelaçados. Quantos nós se encontram, se separam, se unem e se dispersam ao longo da vida. Como num baile que tem ritmo próprio. Vocês já se deram conta de quantos movimentos fazemos na vida? Pois é, isto é a RODA: não tem fim, está sempre terminando ao mesmo tempo em que num novo início.

Na Roda Viva há ventos de esperança, mãos que acolhem e que juntos com os pés, aqueles que nos sustentam, fazem a roda continuar a girar. As diversidades da vida, do humano, a dissonância e a consonância dão movimento à roda! Assim, a ciranda está aberta, ela vai se formando, em verso e prosa, com laços de amizade e quem sabe algumas dificuldades e/ou facilidades... Então os convido: entrem na roda cirandeiros, venham cirandar, coloca tua mão na minha e vem comigo rodar, experimentar...

E para encerrar apresento um trecho da música que deu origem ao título do meu blog:

Roda Viva – Chico Buarque
"Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu
A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega o destino pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Roda-moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração"








domingo, 26 de junho de 2011

Travessia


Hoje inicio com uma frase de Fernando Pessoa da qual gosto muito: 

"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos”.

Essa citação me leva a refletir sobre as repetições que a "vida nos provoca"... Fazer diferente, ir para a novidade é algo necessário e me remete a se arriscar...
Parar e reclamar, esperar a vida passar, ficar remoendo, cheia de dúvidas, sofrendo em silêncio e muitas vezes esperando que algo mágico aconteça, é se “conformar” e ficar naquilo que é habitual. Quer algo mais perturbador do que ficar esperando que as coisas se ajeitem e não fazer nada para que isto de fato aconteça??? É preciso sim sair do campo da fantasia e ir para a realidade... É difícil? Ninguém falou que seria fácil... A vida tem me ensinado, e tenho deixado ela me ensinar, que dividir, comPARTILHAR, me deixar afetar e me permitir estar junto, torna este caminho do “por em ato” mais leve e delicado.  
Então... fica um convite, na verdade dois: ARRISCAR e ComPARTILHAR!!!

Há-braços fortes, Ju

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Abrindo arquivos...


Somos dominados por uma urgência para que as coisas dêem certo... Mas, o que é o certo? Será que isto existe? Passamos a vida esperando que algo mágico aconteça, enquanto ela insiste em nos mostrar que ela está aí, acontecendo todos os dias... 
Nesta semana fui surpreendida por algumas emoções e sentimentos que faziam tempo que não me visitavam com tanta intensidade: medo, tristeza, raiva e frustração. Como lidar com a frustração e aprender que nem sempre tudo é do jeito que se imagina e que se espera? Não há uma receita pronta para enfrentar isso. Aprender a lidar com expectativas, exercitar a tolerância e ter paciência tem a ver com a forma de sermos. Cada um vai descobrindo e experenciando de maneira singular os acontecimentos da vida. E isto é o que há de mais bacana.
A vida é uma série de eventos e podemos aprender a partir daquilo que se repete cotidianamente, mas às vezes não percebemos aquilo que se apresenta insistentemente, ou quando percebemos não sabemos como lidar com isso. Isso me faz lembrar o que escuto muitas vezes na clínica: “por que isso sempre acontece comigo?”.  Não é fácil olhar para aquilo que nos faz sofrer e nem sempre conseguimos fazer isso sozinhos, às vezes até temos um amigo com quem podemos contar, que nos acolhe. Outras vezes ter esse amigo já não é o suficiente, aí é necessária a ajuda de um profissional, que pode ser um psicólogo, que vai auxiliar a olhar para o sofrimento em si e como lidar com ele.
Ficar lamentando o que perdeu ou o que não fez, é não ir para o campo das possibilidades, para o novo. Isto me faz lembrar música da qual gosto muito e que ultimamente tem rondado minha vida: “Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma, até quando o corpo pede um pouco mais de alma, eu sei, a vida não para... a vida é tão rara...” (Paciência – Lenine). E como diz Gonzaguinha: “...vamos lá fazer o que será”.
Há-braços